segunda-feira, novembro 21, 2016

- o carteiro -
a banalização do bom ou "como quero este blog"
num destes dias fui ao teatro. já não vou ao teatro com a frequência com que ia, porque não tenho tempo. Não é que não tenha tempo de ir ao teatro: obviamente não trabalho às horas do teatro, mas como nunca tenho tempo para nada, mesmo o tempo para ir ao teatro é gasto com coisas e actividades triviais.
mas estava a dizer que fui ao teatro. O texto era bom, os actores eram bons, embora, e na minha opinião, várias partes boas não originam naturalmente um todo, bom. ou seja, não era mau, nem bom. isso não é motivo, pelo menos para mim, para aplaudir de pé no final. sei que o "aplaudir de pé" faz parte de um ritual que permite aos actores voltar ao palco, dando tempo ao público para reclamar a sua presença. é um entendimento entre público e actores; uma troca (os actores dão o seu talento e trabalho e o público reclama a sua presença mais uma vez para lhes dizer o quanto são amados. o público consome a sua arte – porque paga, mas também porque a vive - , mas também a pessoa em si através das revistas onde a vida dos artistas, independente da arte, é exposta). mas apesar deste ritual ser um entendimento entre as partes, não quer dizer que tenha de ser sempre praticado. caso contrário, como vamos distinguir o que é mesmo bom do que é mediano? Se o público aplaude e se levanta sempre e com tanto vigor, independentemente do valor do que é mostrado, como é que o actor sabe se o seu trabalho é de facto apreciado?
vemos isso no nosso dia a dia. as pessoas estão constantemente a hiperbolizar, com muita seriedade, tudo o que as rodeia: "A Marta é fantástica"; "este rapaz é top!"; "Ó linda, não te importas de me chegar esse papel"... Isso confunde o receptor e deixa o emissor com uma amplitude de gosto muito limitada, não sendo capaz hierarquizar, catalogar, distinguir. O que é também paradigmático da simplificação que fazemos de tudo pois é de facto mais simples catalogar como "bom" do que fazer uma distinção entre os diferentes "bons" que esse "bom" inclui. (o mesmo se passa com o botão de "like" do facebook. dizer que se gosta de algo, superlativiza esse algo, não havendo espaço para o "mas".)  Não será por acaso que as pessoas hoje em dia também tendem a simplificar palavras: "ela comentou no face" ou "ele colocou uma foto" ou ainda "vou ao pingo comprar bolachas". é mais simples. 
Mas não quero o mais simples para o blog. O mais simples é reproduzir imagens sem qualquer espírito crítico; é fazer circular uma tendência sem a ter experimentado. O que não é simples, é complexo e o que é complexo, custa. Custa mais ainda quando o nosso nível de exigência aumenta e a nossa satisfação não é atingida com qualquer coisa. É por isso que apesar de não postar tanto como antes, continuo a tentar postar textos interessantes e a reflectir sobre o que coloco. Claro que isso não se coaduna com a rapidez com que consumimos a informação (é importante ser o primeiro a ler a notícia, a descobrir, a passar) hoje em dia. Mas eu sou Aquário e os aquarianos vivem sempre num tempo que não é o seu. Por isso o meu tempo e o tempo do belogue não é o da notícia imediata, do post com a imagem da moda, do soundbyte. parafraseando esse monumento da comunicação, o Goucha: “às quintas é dia de fazer amor. Quem está, está. Quem não está, estivesse.” Ou seja: vou continuar a tentar fazer o meu melhor e o que me dá prazer, mesmo que isso implique não seguir as tendências.